sábado, 3 de março de 2007

Violência Urbana e Evangelho Integral

Faltava menos de um Km para chegar no meu escritório quando ouvi a notícia da parte da emissora FM em que estava acidentalmente sintonizado o som do meu carro: “…a Associação dos Estados Ibero-Americanos publicou hoje o mapa da violência nos estados e nas capitais brasileiras entre os anos de 1994 – 2004...blá, blá, blá .... Recife ficou pela segunda vez em primeiro lugar, seguida por Vitória registrando 56 homicídios por cada grupo de 100.000 habitantes... Pernambuco ficou topo das pesquisas sendo apontado como o estado mais violento de país”. Estacionei o carro com um olhar meio catatônico e subi ao escritório. Ao sentar em minha mesa abri meu navegador de internet e tanto na Folha de São Paulo como no Jornal do Comércio a mesma notícia se encontrava presente na lista de notícias do dia. Em virtude das outras atividades que estavam postas em minha agenda pela minha secretária, guardei essa preocupação numa das gavetas da minha mente com a intenção de puxa-la mais tarde e refletir sobre a matéria. Ligação vai, gabinete pastoral vem até que o telefone em cima de minha mesa toca novamente. A Suely estava transferindo uma ligação de minha mãe. Do outro lado da linha ouvi minha mãe: “-Graças a Deus por tudo né Felipinho?” disse “-claro mãe – o que foi desta vez?”, ela me disse: “- o seu pai estava chegando hoje em casa no horário do almoço e quando acionou o portão eletrônico, foi abordado por três homens armados que saíram de um Eco Sport estacionado junto ao portão de casa”. Perguntei “- ta tudo bem com ele?” Ela disse: “-Tá. Está tudo bem. “Além do carro, só levaram a carteira e o celular”. Despedimos e desligamos. Fui forçado a retirar prematuramente a matéria que havia ouvido na rádio e que estava guardada em um dos compartimentos da mente. Ri para mim mesmo pensando: “essa já é a quinta vez que roubam a caminhonete do meu Pai a mão armada”. Em um incidente ele saía de casa quando foi abordado da mesma forma. Em outro, quando estava parado no acostamento da BR comprando plantas, dois ladrões num pálio o abordaram armados pedindo as chaves da pick-up e o meu pai num ato de loucura e comédia jogou as chaves no mato e mandou os ladrões irem catar”. Deus o livrou como o livrou desta última vez e graças a Ele por isso, mas, a minha intriga pessoal não vem apenas do fato de que nós, cidadãos nas capitais brasileiras vivemos reféns do medo da violência. Minha intriga pessoal é: não deveríamos estar assim entregue as baratas! Na minha lógica existe uma aparente contradição. Esta contradição vem do fato de que ao passo que a violência assola sem misericórdia as nossas cidades, o segmento evangélico explode dentro da nossa sociedade. Os evangélicos já somam mais de 25% da sociedade brasileira, número que a 10 anos atrás era menos do que a metade. Isso significa que hoje cerca de 40 milhões de brasileiros se autodenominam “crentes”. Nunca se viu tantas Igrejas sendo abertas com uma diversidade de doutrinas sendo pregadas a cada esquina a la restaurante self-service. Ouvi de um pastor amigo meu que só as Assembléias de Deus somam mais de 800 congregações na cidade do Recife. Não falo com base estatística aqui mas, o meu chute é que a minha denominação que representa um número perto de insignificante ante aos “evangélicos” no país, só na grande Recife possuí mais de 60 congregações. Somemos tudo e teremos um número absurdo de igrejas “evangélicas” na nossa cidade. Aí eu pergunto: Posto que a proposta do Evangelho é de trazer renovação cultural, social e espiritual porque que ao passo que sua proclamação cresce, cresce também a violência e a injustiça social nos nossos centros urbanos? A lógica seria que se tivéssemos mais pessoas transformadas pelo Evangelho, teríamos uma crescente influencia em todos os segmentos da sociedade (política, esportes, artes, mídia, educação etc) que paulatinamente transformaríamos com naturalidade a vida integral da sociedade. A única conclusão que posso chegar é que o Evangelho está sendo pregado de forma adulterada, modificada ou incompleta. O que vemos é uma preocupação exacerbada nos púlpitos de mudarem as pessoas de uma classe social para outra numa tentativa de usufruírem as bênçãos do mundo e não as do Novo Céus- Nova Terra. Além disso, a preocupação é de se salvar indivíduos da perdição e deixarem a terra, o mundo, a sociedade irem para o "quinto dos infernos". Essa má teologia prega que a intenção de Deus é de tirar os “salvos” do mundo antes que chegue o dia em que Ele, o todo-poderoso, detone tudo como detonou Sodoma e Gomorra sendo que desta vez com uma ogiva nuclear. Todavia, enquanto esse dia não chega, usufruamos dos prazeres que este “mundo” pode nos proporcionar. É muita ironia!!

A Bíblia nos ensina que o Evangelho não é nada disso. É justamente o contrário. A preocupação do Evangelho é de trazer os Céus a Terra. Para isso oramos “...seja feita tua vontade aqui na Terra como nos Céus”. O Evangelho não é apenas as boas novas da salvação de indivíduos, é as boas novas da restauração de todas as coisas. Em Apocalipse 4 temos as seguintes palavras de Jesus: “Eis que faço novas todas as coisas!” e em Colossenses 1:20 temos: “havendo por ele feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, tanto as que estão na terra como as que estão nos céus”. Destaque especial para TODAS AS COISAS. Isso quer dizer que Deus não está apenas preocupado em redimir indivíduos. É muito egoísmo nosso acharmos assim. De fato, a restauração de indivíduos é o ápice da sua obra de redenção porque Deus através de uma humanidade que esta sendo restaurada usa esses indivíduos para restaurar com ele toda a criação caída. Se pessoas estão se “convertendo” e tudo ao nosso redor continua fedendo, alguma coisa está errada. Não se pode admitir que façamos cultos e eventos “evangelísticos” enquanto cerca de 800 homicídios acontecem por ano na nossa cidade. Quero lembrar que o crescimento da Igreja primitiva deu-se ao fato de que o Evangelho havia sido incorporado de forma integral na vida dos “irmãos do caminho” numa mudança radical de valores de vida. Eles sim, amaram o mundo vil a sua volta e como José do Egito, viveram para o seu bem estar e por isso impactaram tremendamente a sociedade. Enquanto os pagãos eram exclusivistas com suas finanças e liberais com suas camas, os cristãos eram liberais com suas finanças e exclusivistas com suas camas. Enquanto os pagãos se aglomeravam nas grandes cidades para sugar-lhe os recursos, os cristãos estavam lá em busca do SHALOM integral da cidade. Por isso... “cada dia acrescentava-lhes o Senhor os que iam sendo salvos”.

Este texto é um manifesto não apenas contra a violência, a injustiça social e a depredação do meio ambiente mas, à mensagem incompleta do Evangelho na nossa sociedade, que não muda, não transforma e não se preocupa com nada! Não é sal que fertiliza a terra, nem é luz que ilumina o mundo!

Já dizia Lutero: “não há como modificar a mensagem do Evangelho sem perdê-lo por completo”!

por Felipe Assis

Um comentário:

Anônimo disse...

Interessante a abordagem. Concordo mesmo que deve ter algum problema com o "evangelho" que está sendo pregado nas igrejas. Os crentes não podem ser apáticos às necessidades da comunidade. Por outro lado, para trazer a memória o que nos traz esperança, devemos lembrar que satanás já está derrotado, e como ele sabe que o fim dele é certo, ele tenta fazer a maior desgraça possível. Assim como Hitler, nos últimos dias da guerra, quando percebeu que já estava derrotado, simplesmente matou todos os cativos do campo de consentração de uma só vez.
Parabéns ao blog, por mensagens tão cheias de conteúdos e verdades!