terça-feira, 30 de outubro de 2007

O Evangelho segundo Hairspray

“Mãe não tenha medo de sair de casa, o tempo das pessoas diferentes chegou” foi o que disse Tracy Turnblad, a gordinha bem humorada; personagem principal de Hairspray.

O musical da Broadway que se adapta pela segunda vez às películas de cinema conta a história de um subúrbio americano em plena década de 60 que é entretido por um programa de TV local, onde jovens dançarinos se requebram ao som característico da época. O programa apresenta jovens de perfil calcasiano, atlético e de classe média alta. Ao saber da abertura de uma vaga, Tracy se empolga e se apresenta para fazer o teste nos estúdios da emissóra. Sem ao menos ter uma chance de mostrar o seu talento, Tracy é rejeitada por ter uma cintura avantajada e uma estatura indesejada. Ela representa o marginalizado fruto do exclusivismo presente nos seus dias. Além de Tracy, existem os talentosos jovens Negros que apesar de possuirem “skills”, só podem se apresentar uma vez por ano na edição especial do programa entitulado “Negro Day”. Por ter uma aparencia que foge do padrão, Tracy se une aos estudantes negros na sala de detenção para aperfeiçoar sua “ginga”.

Certo dia, Tracy é notada pela frecha da porta, por um dos jovens participantes do elenco do programa que acaba levando-a para se apresentar no ar. O resultado é que ela se torna a coqueluche do momento. Afinal de contas ela representa a todos que não se enquadram. Tracy representa os “imperfeitos”. Ela representa o negro, o pobre e o feio. Ela representa o que o evangelho representa. O evangelho representa a loucura, a fraqueza, a pobreza, e a feiura. Ou seja, adjetivos que fogem dos padrões da religiosidade humana. A religiosidade aceita aqueles que se enquadram no seu rótulo. O evangelho aceita os “diferentes”, aqueles que são postos à margem da performance do sucesso. Na verdade, o Evangelho só aceita e inclui os que são excluidos. Inclusão aos excluidos no musical soa profano, assim como soa nas páginas dos evangelhos e nos guetos da religiosidade evangélica dos nossos dias.
Vem a minha mente a experiencia que Pedro teve quando resistia ao pensamento de que Deus passava a incluir a seu povo não apenas judeus mas, gentios imundos. A palavra de Deus a Pedro em síntese, ecoa em unísono com as palavras de Tracy. “Não tenha medo, o tempo para as pessoas diferentes chegou!”

por Felipe Assis

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

O Religiosismo que mutila o Evangelho – parte II

A Bíblia diz em Levítico 21:17-20 que aqueles que tivessem os corpos mutilados, danificados, ou fossem "diferentes", não se qualificavam para o oferecimento do pão. Do mesmo modo, mulheres menstruadas, homens que recentemente tivessem tido emissão noturna, pessoas com enfermidade de pele ou feridas supurentas, alguém que tivesse tocado em cadáver, ou tivesse comido animais como lagosta, ostras, porco, coelho, etc. – todos esses eram declarados cerimonialmente impuros. A pratica de algo assim era vista como uma transgressão à lei ritualística de Deus. Os religiosos não entenderam a graça intrínsica nas linhas da Lei, e acharam que qualquer um pecaria dependendo do que comesse, tocasse, ou da sua constituição genética.

Parece inconcebível, porém, esse era o ambiente que definia o judaísmo da época. A união da lei mosaica e das regras farisaicas. Por esta razão, todos os dias, os judeus religiosos nas suas orações matinais davam graças a Deus por "não ter nascido mulher... por não ser gentio... por não ser escravo..." etc.

Na concepção errada do pecado, transgredir estas leis era ofender a Deus. Nosso Senhor Jesus veio e aplicou a lei, tal e como era. A lei é um reduto da graça. Ele mostrou como deve ser o verdadeiro religioso. Quando Jesus veio, ele aprimorou a mira das pessoas que estava totalmente fora de foco. Acabou com essa história de "puros" e "impuros". Falou abertamente: "vocês não entenderam nada!". Na verdade, o texto em Levítico (exposto acima) mostrava que aquelas determinadas pessoas, tidas como "esquisitas" e discriminadas pelos religiosos, não ofereceriam o pão, porém seriam os beneficiários mais diretos do culto. Seriam privilegiados por isso. Não era para desqualificá-los, e sim, para honrá-los. Logo, os religiosos pensaram em desqualificar e não em amparar. O religiosismo sempre vai se preocupar com as trivialidades, negligenciando as coisas mais importantes.

O religiosismo é legalista, olha para si, ao invés de olhar para a comunidade. Olha para os seus sentimentos ao invés de olhar para Cristo. Não é seguidor de Cristo, é satisfazedor de si próprio.

Pr. Waldemir Lopes

O Religiosismo que mutila o Evangelho - Parte I

A lei do Senhor é perfeita e santa. Porém, o legalismo religioso a manipulou a fim de torcê-la segundo o seu querer. Daí surgiram as discriminações. A lei destila graça por onde quer que olhe. Ela preparava a chegada da graça explícita em Cristo. Segundo Paulo, a lei nos serviu de tutor, para nos conduzir a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados. Mas, depois que veio a fé, já não estamos debaixo de tutores (Efésios 3:23-35). Paulo, sim, tinha entendido o que nós devemos entender. A lei serviu para guardar, e nos orientar na comunhão com Deus até que viesse a fé e a graça. Quando por fim, Jesus doa a sua justiça perfeita a aqueles que crêem com a fé que é posta no coração pelo próprio Senhor.

Quando veio Jesus e começou a "quebrar a lei" – na verdade, deu o seu verdadeiro sentido - tocando em leprosos, em mortos, comendo com pecadores, recebendo adoração de mulheres prostitutas, perdoando pecado, dispensado graça, trabalhando no sábado, e conversando com uma mulher samaritana - para consternação dos discípulos, que sabiam que "os judeus não se relacionavam com os samaritanos". Inclusive, essa mulher, rejeitada pelos judeus por causa da sua raça, rejeitada pelos vizinhos por causa dos seus muitos casamentos, veio a ser a primeira missionária designada por Jesus e a primeira pessoa a quem ele francamente revelou a sua identidade como Messias. A aproximação de Jesus com as pessoas impuras consternava os seus compatriotas... Tenho pensado como ainda temos relutância em nos aproximar de um não-crente, só porque não pensa como nós, ou não age como nós. Ora, isso é "religiosismo" (Filosofia religiosa carnal e diabólica). Uma falácia da verdadeira religiosidade.

Na verdade, o Evangelho nos diz que todos nós somos esquisitos, mas Deus nos ama assim mesmo – quem quiser vir participar do Reino que venha. Ou seja, como dizemos aqui na igreja: "nós somos pior do que imaginamos, porém a graça de Deus é muito maior do que possamos imaginar".

Pr. Waldemir Lopes

Crime e Castigo

Terminei esta semana de ler “Crime e Castigo” de Fiodor Dostoievski. Uma belíssima literatura, que posso catalogar como “top” pela sua estrutura, e beleza evangélica das suas páginas. Crime e Castigo não é uma leitura simples, confesso que tive que insistir muito no início do livro para prosseguir a sua leitura.

O personagem principal, Rashkólnikov, é um homem angustiado pela sombra de se tornar alguém melhor. O personagem mata uma agiota e a sua irmã. O livro também relata o seu envolvimento com uma prostituta e a grande influência dela, que compartilha algumas leituras da Bíblia. Por fim, Rashkólnikov acaba preso e é levado por 8 anos para uma cadeia na Sibéria. Porém, ao contrário do que se possa pensar, o “castigo” a Rashkólnikov não é a cadeia siberiana, mas a sua redenção e regeneração como indivíduo nos braços de uma prostituta pela Palavra do Evangelho. A graça do Evangelho foi o "castigo" para aquela alma rebelde, desumana, angustiada, e má.

Regeneração não é uma mudança de mente ou propósito feita a base de duros exercícios espirituais perpetrados pelo próprio pecador. Não é conseguida mediante uma forte determinação. Os homens espiritualmente mortos não podem ter nenhum desejo pelas coisas de Deus. Regenerar é obra do Espírito. É um fazer viver para Deus, ou ser despertado da morte espiritual para a nova vida espiritual. É, portanto, uma criação de um novo coração ou de uma nova vida interior, feita unicamente por Deus. Aqueles que nasceram espiritualmente fazem parte do Reino e da família de Deus, unidos misticamente por Cristo.

Escrevo essas linhas, com uma profunda comoção na alma, depois de me inteirar da morte de uma de nossas irmãs, a dentista e membro da nossa primeira Igreja Presbiteriana, Rafaela Arcoverde; brutalmente e covardemente assassinada pelas costas por um indivíduo... talvez... um “Rashkólnikov da vida”. Que Deus tenha piedade desse “Rashkólnikov” e faça-o participar dessa maravilhosa benção da regeneração. Lembrando sempre as palavras de John Newton que "O cristianismo não é um sistema de doutrina, mas um formador de novas criaturas".

Pr. Waldemir Lopes

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

O fantasma de Ario visita a Igreja Batista da Capunga


Quem me conhece sabe que sou um individuo mente aberta. Inclusive existem conservadores dentro da minha própria corrente teológica (reformada) que me vêem como liberal. Eu os entendo. Talvez seja porque gosto de rock, ou quem sabe porque tenho uma tatuagem com um texto de Lutero no meu ombro direito. Pode até ser que seja porque já me viram tomar um copo de cerveja ou uma taça de vinho com amigos em algum lugar. Muitos sabem também que sou simpatizante do ministério de diaconia feminino e que apesar de ser um cessacionista, convivo muito bem com os pentecostais. Aprendi com a Confissão de Fé de Westminster que a Bíblia não é igualmente clara em todos os assuntos não essenciais para a salvação e por isso, creio que haja liberdade para opiniões divergentes nessas questões. Recebi também como legado da reforma protestante o principio que a liberdade de consciência cativa as escrituras jamais deve ser violada. Experimentei também ao conhecer o Evangelho de forma profunda que a graça nivela a todos. Discípulos de Jesus são um bando de pecadores de meia tigela que carecem de graça e nenhum deles, digo novamente, nenhum; detém o conhecimento perfeito e exaustivo à respeito de Deus e de sua obra revelada. Quem revela não é falho mas, quem interpreta a revelação sim. É falho, e muito falho. Quero dizer até aqui que sou tolerante com pensamentos divergentes ao meu.
A única coisa que como ministro da palavra não posso admitir é indiferença da minha parte quando a Igreja do Senhor Jesus está sob ataque daqueles que se vestem como ovelhas para destruir convicções dos recém-nascidos na fé. Sei que ovelhinhas recém nascidas por indefesas que são, vez por outra são abaladas por ventos de falsas doutrinas. À essas, como o exemplo da Igreja na Galácia, Paulo tem muita cautela para desconstruir o erro e não as pessoas enganadas. Sabe que são frágeis e na maioria das vezes sinceros por isso, tem cuidado para não jogar fora o bebê com a água suja. Todavia, com falsos mestres a história é outra. Esses que possuem consciência do erro e demonstram experiência na arena da religião, Jesus e os seus apóstolos no Novo Testamento os chama de Raposas, Cachorros, Lobos e até de Anti-cristos! Os pais da Igreja que chegaram logo após a era apostólica fizeram o mesmo. Atanásio combateu Ario, Tertulliano combateu Praxeas, Agostinho combateu Pelagios e Calvino combateu Miguel de Cervetus. Em todos os casos, tanto no novo testamento como na era patrística, heresias à respeito da natureza de Cristo e da constituição Trinitariana não eram toleradas. Admito que os nossos pais na fé e os nossos amados irmãos reformadores chegaram até a usar de métodos violentos para caçar tais hereges. Não concordo com essa metodologia. Concordo como os Apóstolos abordaram essas heresias. Escreviam e publicamente pregavam expondo os impostores, e com o auxilio do Espírito presente na igreja, os dejetos eram evacuados do corpo (1 João 2.19).
Quis armar o cenário para fazer um denuncia. Faço isso no mesmo espírito dos Apóstolos. Não quero soar como detentor de toda verdade nem como moralmente superior a ninguém. Muito pelo contrario, venho em estado de submissão ao oficio que me foi confiado pelo Senhor Jesus Cristo.
Aqui no Recife, numa das mais estimadas e tradicionais igrejas da cidade – A Igreja Batista da Capunga, em sua maior sala de escola dominical, o fantasma do Presbítero Ario voltou a assombrar. À frente da turma com dezenas de novos convertidos o tal mestre refuta os fundamentos Trinitarianos infectando assim pequeninos na fé com o vírus da cristologia ariana, causando nos inocentes uma patologia teológica que os derruba no leito da incredulidade. Impossibilitando-os de experimentar o verdadeiro evangelho do verdadeiro Cristo. O principio central da epistemologia de Ario (256-336) que derivou de Luciano era: “O que não cabe na mente humana não pode ser aceito como verdade”. Para Arius e para o professor da Capunga, o mistério da Perichoresis é irracional. A Perichoresis, termo este criado por Gregório, para explicar a inabilidade da mente humana de compreender a complexidade das relações na Trindade. Ou seja, O Pai é Deus, O Filho é Deus e o Espírito é Deus. Todos são um mas, cada um é uma pessoa distinta com poderes iguais e sem principio nem fim. O Pai é Pai e o Filho é Filho eternamente gerado do Pai. Admito que é incompreensível e por esta razão nunca poderia ter saído da mente de um ser criado. De acordo com Ario, Jesus é deus e o Pai é Deus. Em miúdos, O Filho é um Deus inferior ao Pai por ter sido criado como nós e como os anjos. Se guardassem essas idéias para si mesmos seria ruim mas, não pior do que esta acontecendo. O que me preocupa é que a fabrica ariana instalada nas salas da Capunga começa a produzir em série. Ensino numa instituição teológica onde pelo menos três já apareceram. Inclusive o filho do dito cujo (professor da Capunga), que até sugeriu minha demissão através de um abaixo assinado pelas minhas costas entre os meus alunos. Ainda bem que meus alunos não são tão despreparados assim para cair nas teias desta epidemia que já foi erradicada pela Igreja no concilio de Nicéia há 1700 anos atrás. Comentava ele que eu ensinava heresias como as do tipo da eleição e da trindade. Pergunto eu agora. O que ele queria que aprendêssemos num seminário de porte? As heresias que seu papai ressuscitou da cova ariana? De modo nenhum, não só as rejeitamos com base na ortodoxia eclesiástica mas, também desde hoje, denunciamos e passamos a combater. Clamo aos pastores da Igreja da Batista da Capunga que não tolerem erros teológicos desta natureza em suas comunidades. Por mais influentes e caristmáticos que sejam esses falsos mestres, não vale a pena colocar em risco a saúde espiritual de seu rebanho. Principalmente com uma doutrina como essa; essencial para o cristianismo. Doutrina esta que fere a natureza hipostática do próprio Senhor da Igreja. Quero concluir afirmando com base no credo de Atanásio, que o próprio Lutero julgou ser infalível; que “Aquele que não crê nela (doutrina da Trindade) não poderá ser salvo”! Minha oração é que estes falsos mestres se convertam e que não morram afirmando como Miguel de Cervetos afirmou atado à uma fogueira: “Jesus, filho do Eterno Deus,( ao invés de Jesus, Eterno Filho de Deus) tenha misericórdia de mim”.

por Felipe Assis